Sobre eles, os homens que vieram de longe


É verdade, eu disse a muita gente que eu tinha superado. Que eu seguiria, que eu amaria, que eu me deixaria levar. É verdade, namorei outros homens, outros meninos, outras bocas e outros abraços. É verdade, é verdade. Você sabe disso. Talvez porque também tenha feito (ou ainda faça).  Não importa muito, os caminhos seguem da mesma forma, você com ela, você sem ela, eu com ele, eu sem ele.

Uma vez escrevi um texto superando. Eu sempre me enganei. Da última vez, eu estava firme. Eu estive firme abraçando a distância - por algum motivo, é a minha sina, é o meu destino. No início, havia mergulhado no relacionamento numa tentativa estranha e cega de auto-superá-lo, o que pra mim fazia todo sentido, embora não fizesse sentido algum. Após três meses, continuei pensando em você. Após seis meses, eu já tinha desistido de sufocá-lo com outro alguém - estava me conformando com a ideia de que isso não aconteceria.


E não aconteceu. Após cada término ainda remonto a ponte aérea. Remonto, como quem vai a esquina comprar pão, o caminho que fazia com você para ir ao cinema a pé: eu ia sozinha e você, de carro. E novamente refaço as palavras, os carinhos, os apelidos, os bonequinhos e a coleção do Star Wars. É difícil, eu sei. Sei também que sempre será.

Da última vez que nos encontramos, eu menti. Menti tanto que ao chegar em casa chorei por duas décadas. Menti que estava bem, que havia encontrado alguém. Menti que queria ser sua amiga que podia lidar com isso. Você fingiu ser outra pessoa, distante, frio. Eu não poderia culpá-lo por isso.

Ainda não posso.


Mas hoje você já não se lembra de nada. Assim como eu tenho minhas lembranças falhas, picotadas pelos descasos dos pingos de chuva da sua cidade acinzentada. Pensei que o futuro talvez um dia me levasse para perto de ti. Acreditei nisso durante algum tempo.

Até que enfim parei de acreditar.

Afinal, do que fala essa história de chuva?


Sabem quando escrever a história não é suficiente? Quando é necessário falar dela pelos quatro cantos, comentar personagens, estrutura, desabafar acerca de enredo e até dos problemas que você mesma encontrou? Então. É o caso de "Caçadores de Tempestade". E é por isso que decidi escrever esse post. Não, ninguém veio me perguntar sobre nada disso. Ninguém me mandou inbox com comentários lindos sobre o livro. Ninguém me disse que estava, simplesmente, lendo. Na real mesmo, está difícil de acreditar que alguém esteja efetivamente acompanhando a história no Wattpad, a despeito dos meus exaustivos esforços de divulgação. Ser escritor é ser escravo dos pedidos suplicantes de leitura. Pelo menos até você ser capaz de atrair leitores por si mesmo - não é meu caso, infelizmente. 

Pois bem, o fato é que o post não é sobre isso (ainda, porque estou planejando algo do tipo para semana que vem). O post é sobre a história, sobre os "Caçadores de Tempestade". Sobre tudo aquilo que ninguém me perguntou mas me deu vontade de falar. 

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Vamos conversar

A história revisada mil vezes
Essa história nasceu da ideia de uma única cena, uma cena que pode ser lida no capítulo 2 (já online, corram lá) no Wattapad. Trata-se de uma festa de formatura onde uma menina com o cabelo muito negro tira uma pedra preciosa de entre os cabelos - uma esmeralda, na verdade. Todo o contexto em torno desse ato pode ser entendido lenda o livro. Mas caso você queira adiantamentos, dá para saber que essa menina é Lua Cheia, a dita "traidora" do grupo de amigos principais. Ela troca uma pedra cheia de poder por uma poção de amor - tudo na tentativa de reconquistar o ex-namorado. Sim, eu sei, é bastante clichê (ou vibe "Crespúculo", como uma vez me disseram). Eu também acho. Mas o fato é que esse tipo de coisa vende, além de ser obviamente uma cena típica de livro adolescente (mais uma vez: sabemos que jovens são os grandes fanáticos do mercado).  

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Jovem quando vê livro novo do autor favorito.

Essa cena despontou em minha mente quando eu tinha por volta dos 15 anos. Na época, eu escrevia uma outra história (uma cuja divulgação jamais acontecerá, de tão ruim), o que gerou o adiamento de "Caçadores..." para um ano mais tarde, quando eu tinha 16 anos. Evidentemente, ainda que eu tenha escrito outras coisas anteriormente, CT não era uma obra de arte, considerando a minha idade quando sentei para desenvolver o enredo. Não era e, apesar de todos os anos que se passaram desde então (quase dez, façam as contas), continua não sendo. É uma história com muitíssimas falhas, problemas estruturais e carente de revisão e edição. É claro, cheguei a reescrever inúmeras cenas, ajeitar aqui e ali, editar e cortar uma série de parágrafos. Ainda assim, está longe do ideal. Tenho a sensação, aliás, de que ela jamais estará perfeita. 

Ah, então por isso que você jogou no Wattpad? Por que você acha que não é boa o bastante para a publicação?
Não. Eu tenho a real (talvez cega) esperança de publicar esse livro em algum momento. O Wattpad é uma forma de tentar conseguir isso. Eu apenas joguei CT na plataforma porque é possivelmente a ideia de que mais me orgulho de ter tido. É a minha história favorita. É verdade, é a coisa mais falha que eu já escrevi, mas é também o livro pelo qual tenho mais apreço, por algum motivo que não sei explicar, apesar de todos os problemas gritantes. 

Ok, mas o livro fala do que exatamente? Por que você é tão apegada a ele?
O livro fala de muita coisa, meu amigo. Resumidamente:


Eu acredito que essa sinopse dê conta do recado. Sobre eu ser apegada a essa história, aí já são outros 500. Acredito que o grupinho principal tenha características que me são muito semelhantes, cada um do seu próprio jeito, é claro. Temos cinco personagens que fazem parte de grupo: Raio, Trovão (que são irmãos), Lua Cheia, Solar e Relâmpago. O vínculo entre os dois primeiros possivelmente foi inspirado em Dean e Sam de Supernatural, com toda a coisa de amor entre irmãos, algo que eu sempre achei muito bem construído. Do mesmo modo, acho que são os dois personagens que mais se parecem comigo. Por exemplo: Raio tem a ideologia que uma vez, em minha vida, também carreguei. Ele é alguém idealista, cheio de atitudes precipitadas, e gosta muito (talvez até demais) de mandar. Ao mesmo tempo, Trovão é quem narra a história na maior parte dos capítulos*, o que me faz vê-lo como uma espécie de consciência externa. É como se os dois fossem minha imagem e semelhança, 
*Alguns capítulos são narrados por outros personagens, sempre em primeira pessoa. 

Se Trovão e Raio são parecidos comigo, os outros três são quase cópias de pessoas que eu conheço - embora com algumas alterações, é claro. Lua Cheia fisicamente é igual à minha melhor amiga: esguia, o rosto comprido e os cabelos negros demais. Ao mesmo tempo, ambas são pessoas inconsequentes. Solar, por outro lado, foi inspirada na minha avó materna, uma espécie de entidade maternal do grupo. Por fim, Relâmpago é o dito "médico": o único a cursar uma faculdade, a despeito do que se espera quando se termina o ensino médio*.
*sim, temos escola convencional no reino de Eulária. E não, não tem nada a ver com Hogwarts.

Mas por que esses nomes? Eles estão confundindo minha cabeça!
Eu sei, muitas pessoas chegaram a desistir de ler o livro por causa disso. Isso me fez questionar também. Mas acontece que eu queria algo que desviasse do mundo que conhecemos. Algo incomodativo no primeiro momento, algo que realmente fosse capaz de perturbar. E então dei a eles nomes e sobrenomes quase ridículos de tão óbvios. Todos os seres de Eulária possuem nomes de fenômenos naturais ou simplesmente coisas fornecidas pelo mundo - ou adaptações disso, como "Solar".  A escolha para os três meninos (Raio, Trovão e Relâmpago) não foi ao acaso. Queria algo que mostrasse e gritasse que eles eram muito próximos. Tanto que chegavam a se confundir. Era algo proposital, jamais ao acaso. No entanto, hoje questiono se isso foi uma boa ideia. 

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Ainda tô confusa.

Então quer dizer que eles têm nome, sobrenome, árvore geneológica?
Sim. Todos eles têm uma estrutura montada, com direito a dois sobrenomes, nome do pai, nome da mãe, história de vida, como nasceram, como cresceram, como são e quem são. Confesso que considerei postar essas coisas aqui, mas achei que o post ficaria grande demais.*
*e eu sempre duvido que alguém queira de fato ler a respeito. 

É isso. Eu poderia passar dias escrevendo nesse post, mas acho que seria cansativo demais para vocês. De qualquer forma, você pode saber mais a respeito de Eulária lendo a história. Afinal, eu nunca pedi nada! Além disso, serão só 16 capítulos ao todo. Não é tão longo assim (apesar de os capítulos em si o serem). E o mais importante: vocês já pararam para pensar que é uma fantasia postada gratuitamente na internet, um livro mais barato do que qualquer um que vocês um dia encontrarão por aí? Tentem pensar nisso. Vocês me fariam muito feliz :) 




Por que decidi migrar pro Wattpad



Faz uns seis meses que eu trabalho em uma editora de pequeno porte. Nesse meio tempo, tive de aprender a olhar os livros pelo outro lado da coisa - o lado do editor. Fui à Bienal do Livro de São Paulo nessa função e participei (participo) da seleção de originais. Ao contrário da maioria, a editora na qual trabalho só publica nacionais. E ao contrário do restante, não me sinto exatamente confortável em submeter meu livro a ela por se tratar de uma quebra de protocolo como funcionária. Acontece que, nesses seis meses, meu contrato com a minha editora de raiz acabou. E me refiro, dessa vez, à editora que publicou meu livro "Joana e Maurício", não a que me contratou como assistente editorial. Depois de graves problemas envolvendo direitos autorais e escassez de informações, decidi por não renovar o mesmo contrato.

O que me levou ao problema atual: como arrumar uma editora para esse e para os meus próximos livros?

Entendam, escritor escreve. Não depende exatamente de como  isso vem ao mundo, o fato é que é necessário cuspir "esses nossos negócios" que ficam presos aqui dentro. Ter ou não uma editora pra publicar nem de longe influencia, embora ajude bastante - convenhamos, a escrever. É uma bomba que se sustenta sozinha. 

Ainda assim, escritor precisa de leitor. Ter uma editora (ou não) meio que, hoje em dia, é o atestado de comprovação de leitura. Sem uma casa editorial acolhendo, é quase impossível conseguir alcançar qualquer tipo de público. Foi nesse momento que considerei publicar meu livro no Wattpad.

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Wattpad? Quê? É de comer?

Calma! Vou explicar!
O Wattpad é uma plataforma online para escritores. Nesse sentido, qualquer tipo de texto inédito pode ser jogado lá, para ser lido gratuitamente e por pessoas de qualquer lugar. Muitos dos livros que fizeram sucesso na plataforma acabaram chamando a atenção de editoras. É o caso de "Mais leve que o ar", do Felipe Sali, publicado pela Lote 42; e da Thati Machado, hoje da Astral Cultural. Para quem está cansado de ser subordinado a editoras pequenas que só anseiam ganhar dinheiro as custas do seu "talento", vale a pena dar uma olhada. 

Não vou mentir: tem muito escritor lá que é tão bom quanto qualquer um que tenha publicado por uma editora convencional. E nem assim chama a atenção dos leitores. Da mesma forma, tem aquelas histórias com um número absurdo de visualizações - mas que são claramente mal estruturadas. Digo isso na minha posição de assistente editorial, porque acabamos vendo o que é possível publicar e o que não é. Na verdade, acaba sendo mais no viés de enxergar o que é possível editar e o que não é. 

A fórmula meio que se limita à revisão. Quanto mais bem escrito estiver seu trabalho, mais fácil das pessoas gostarem, dos leitores se apaixonarem. Então por que não?

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Por que não?

Por que é uma boa opção nesse momento?
Porque, basicamente, é a janela principal das editoras atualmente. É claro que elas olham para outras mídias, como os youtubers. Mas é em publicação independente que eu tenho visto o nacional começar. Ter leitores é a preocupação número um de todo escritor. Estar no Wattpad já garante, instantaneamente, esse público, o que torna a plataforma uma boa opção. 

É claro, há outras formas de ter esse leitor. A Amazon foi capaz de revelar talentos nacionais, da mesma maneira. O problema é que se trata de um meio pago. Não ao autor, é claro, mas ao leitor. Para ler o meu livro, o livro de alguém desconhecido, o leitor precisa pagar um valor simbólico. Convenhamos: eu sou ninguém. O Kindle ainda não é um utensílio de grande consumo e uso no Brasil. O alcance pode ser estrondoso, mas também pode não ser. Então por que não tentar pela via mais fácil por enquanto? Por que não tentar o Wattpad e depois, quem sabe, talvez quando a história já estiver completa, quando eu já for alguém, jogar na Amazon?

Ter um canal, uma mídia de conversa, é uma forma de ganhar espaço, é uma forma de ser visto. E quando você escreve bem (ou ao menos tenta), o público e o leitor acabam sendo consequência. A editora convencional hoje em dia trabalha com números - com vendas. É claro que o texto estar efetivamente bem escrito é importante: mas o que importa é quem o autor é. O foco agora está em quem escreve a obra e não na obra em si. Ainda que não seja um texto de excelência, dá pra editar aqui ou ali. São prioridades diferentes. Ter um texto bem estruturado é a preocupação imediata. Torna-se alguém na internet deve ser a prioridade número dois. E é aí que o (meu) problema começa*.
*mas isso é papo para outra postagem.


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Porque eu não tenho gente querendo me fotografar nem me entrevistar, :(

Mas enquanto não sou famosa....
Por enquanto, a gente fica nessa tentativa de sucesso microscópico. Vou falar um pouco mais da história que estou jogando na plataforma em outra postagem, mas quem já estiver curioso (ou sem fazer nada), já pode dar aquela conferida. Trata-se de uma história de fantasia juvenil chamada "Caçadores de Tempestade". Só clicar: o prólogo já está online. As atualizações ocorrerão de modo semelhante a uma novela: postagens semanais, todas as quartas feiras.  


Aqueles por trás dos livros: conhecendo editores e escritores - 2


Há pouco tempo publiquei o primeiro post de uma sequência de entrevistas voltadas ao mercado editorial. Na postagem de estreia, divulguei as falas de Pedro Almeida, editor-chefe da editora Faro Editorial. Dessa vez, em especial porque minha ideia inicial era gerar uma sequência que pudesse ser um casamento perfeito, trago uma conversa corriqueira com o autor Vinícius Grossos, sucesso de vendas na Bienal do Livro de 2015 e 2016. Grossos já publicou três livros: "Sereia Negra", "O garoto quase atropelado" e "1+1: a matemática do amor". Desses, apenas o primeiro não foi publicado pela Faro, enquanto o último é o resultado de uma parceria com Augusto Alvarenga. 

Dessa vez, falamos um pouquinho a respeito da posição do escritor frente ao editor: como Grossos foi parar na Faro e o que o motiva a seguir em frente. Além disso, assim como na entrevista de Almeida, preferi fazer alusão a assuntos atuais, como a plataformas de escrita da internet.  

Enjoy. 

1) Você e o Augusto Alvarenga lançaram um livro sobre representatividade, chamado "1+1: a matemática do amor". Você acredita que a Bienal do Livro, tanto a de São Paulo quanto a do Rio ou de qualquer outra cidade, tem o potencial para desencadear novos gêneros literários? 
Grossos: Eu acho que a Bienal na verdade é a grande vitrine: é onde os vários gêneros e estilos literários se encontram! Lá tem para todos os gostos e estilos. E, felizmente, mesmo tratando de um tema ainda não tão aceito, o "1+1" conseguiu se destacar no evento.

Grossos e Alvarenga com o livro "1+1". Fonte: http://www.playmymind.com.br/2016/05/previa-do-1-mais-1.html

2) Há um investimento maior relacionado ao autor brasileiro, especialmente por conta da crise. Você pode comentar um pouco sobre as possíveis ajudas que as plataformas digitais fornecem para esses novos autores (como Wattpad, Amazon, até o Youtube)?
Grossos: Então, o Wattpad, o youtube e as redes sociais em geral têm uma função muito parecida: elas estreitam os laços entre o autor e o leitor. Antes esse caminho sofria muitos ruídos e agora acontece de uma forma direta, o que é muito legal. As duas partes podem entender melhor os sentimentos um do outro. E é como você disse: a crise fez o mercado procurar algumas chaves dentro do próprio país, por causa de uma série de facilidades. E felizmente eles encontraram vários talentos. 

3) Como foi para você alcançar uma editora? Você acredita que o envio do original, aquele envio tradicional, está sumindo? 
Grossos: Foi uma batalha bem cansativa. Desde 2010 eu escrevo e só entrei em uma editora grande em 2015. A verdade é que não existe um caminho certo; cada um encontra o seu jeito de fazer dar certo. Quando enviei o original de "O garoto quase atropelado" para a Faro, eles ainda recebiam de maneira tradicional. Só que eles já tinham ouvido falar de mim por causa do "Sereia Negra", o que fez com que olhassem para o livro de forma mais atenciosa. O fato é que hoje em dia está acontecendo um caminho inverso: o autor tem se lançado independente, conseguido seu público base, para depois ir para uma editora. Mas isso é muito dinâmico. Amanhã pode ser que tudo mude novamente. 

Grossos com seu primeiro livro, "Sereia Negra". Fonte: http://www.detudoumpouquinho.com/2015/12/conhecendo-o-autor-vinicius-grossos.html

4) Como surgiu a ideia de unir blog, escritor e youtube nesse novo livro (recentemente anunciado)? Você acredita que o livro de contos é o formato que mais vem ganhando espaço? 
Grossos: A ideia veio da editora, e eles meio que pensaram em fazer algo que ainda não tinha no mercado. Realmente, é a primeira vez que eu vejo essa união de 3 segmentos de pessoas que se comunicam com os jovens. E eles quiseram fazer isso, porque meu editor percebeu que por mais que eu, a Gabi e Thais tivéssemos maneiras e plataformas diferentes para nos comunicarmos, nossos textos tinham uma ligação quase complementar. Acredito muito esse segmento porque, primeiro, provoca a junção das bases de fãs; e, segundo, traz histórias mais rápidas e dinâmicas, mais fáceis de serem absorvidas. 

5) Em relação aos seus dois livros lançados pela Faro e o que você lançou anteriormente: você acredita que sua forma de escrever mudou? Acredita que o mercado influencia isso? 
Grossos: Muitoooooooo! O "Sereia Negra" infelizmente não teve uma intervenção de editor, coisa que os outros livros tiveram. E aprender esses pequenos detalhes me fez crescer muito como autor, como profissional. Em relação à influência do mercado... Eu ainda não consegui sentir isso. A maioria dos livros que eu ainda pretendo fazer, surgiram de ideias anteriores ao "O garoto quase atropelado", apesar de acreditar que uma coisa ou outra a gente sempre absorve.

6) Muita gente questiona a profissão de escritor como promotora de renda. Você acredita que é possível, no Brasil, viver apenas de escrita? 
Grossos: Bem, a verdade é que esse é o meu sonho, então preciso acreditar que é possível, sim. Acho que se você não é uma pessoa famosa e sua grande ferramenta é a escrita, esse caminho vai ser longo e pode demorar, mas em algum momento.... acontece.

Arte da capa de "O garoto quase atropelado".

Agradecimentos finais: agradeço imensamente ao Vinícius e à Faro por terem se aberto a esse tipo de contato. Para mais informações sobre a editora, corre aqui

Aqueles por trás dos livros: conhecendo editores e escritores


Recentemente, estive encarando perspectivas diferentes acerca da produção literária. Na minha atual posição (sou editora na Multifoco), sinto que minha identidade se confunde entre a figura do autor e a figura do editor. A primeira carcaça, já há muito parte de mim, agora bate de frente com meu trabalho no mercado editorial. Sou, afinal, editora. Ao mesmo tempo, nunca me foi dito que uma profissão anularia a outra.

De qualquer forma, em decorrência de um trabalho na graduação, me foi solicitado certo número de entrevistas com editores e escritores influentes do mundo literário. Após ver o resultado, percebi que muitas das respostas deveriam ser compartilhadas com as pessoas. Mais do que isso: resolvi pedir permissão para publicá-las por aqui, de tão interessantes. Se possível, farei uma série de postagens com o tema. O primeiro a ter voz é Pedro Almeida, editor-chefe da Faro Editorial

Enjoy. 

Bienal do Livro de São Paulo.

1) Primeiramente, obrigada por aceitar fornecer a entrevista, Pedro. Para começar, poderia falar um pouco sobre a Bienal do Livro de São Paulo? Devido aos dez dias de Bienal, o mercado editorial esteve em grande rebuliço. Você acredita, como editor, que o evento foi capaz de ajudar a reverter o processo de queda das vendas (pesquisa realizada em 2015)? 
Almeida: A Bienal é sempre um evento de divulgação e exposição de marcas e lançamentos, mas não tem capacidade de alterar a curva do mercado. O mercado, não só de livros, vive o problema da crise econômica.

2) Há muita discussão em torno da Bienal da Livro especialmente em decorrência do embate (já bastante dissecado) entre o livro físico e o livro digital. Mais do que isso, vivemos em um momento em que plataformas digitais vêm aparecendo como precursoras da leitura, especialmente entre o público jovem. Você acredita que o Wattpad, ou mesmo a Amazon e o Youtube, vieram para subtrair das editoras ou somar? 
Almeida: Vieram para somar. Não há uma rixa entre essas plataformas e é o publico leitor quem irá fazer as empresas se moverem mais em uma direção do que em outra. Hoje os livros digitais representam cerca de 3 a 5% das vendas dos livros físicos há 3 anos consecutivos. Se vão ocupar mais espaço, não sabemos. O produto é o mesmo. O hábito das pessoas é que vai definir se preferem mais um tipo ou outro. O que o mercado precisa fazer é criar opções de negócios que sejam sustentáveis para as editoras apostarem em ambas as opções.

3) Em determinada entrevista, você chegou a dizer que a crise ajudou o mercado editorial a olhar para o autor brasileiro. Você acredita que a Bienal do Livro também serviu (e serve), como evento, para promover esse contato entre o novo autor e o editor? Como isso funcionaria? 
Almeida: Sim.  Com o dólar em alta os editores começaram a pensar mais nos autores nacionais que tem custo de investimento editorial até 70% menor que um autor estrangeiro, pois não há adiantamento de Direitos Autorais e custos de tradução. A Bienal não é apenas uma feira de livros, ou feira de descontos. É uma oportunidade de autores e leitores se encontrarem. Você pode observar que é o espaço em que, além dos debates e eventos, há contato a todo momento. Isso é extremamente positivo. Há autores novos que chegam a vender numa Bienal o dobro de livros de grandes nomes internacionais e isso é fruto desse envolvimento.

Bienal Internacional do Livro de São Paulo em 2016.

4) Ainda sobre esse assunto, há maior atenção às plataformas de consumo de literatura digital nesse momento. Você acredita que o convencional envio de originais está se extinguindo? 
Almeida: Há mais barulho sobre as novas plataformas porque são novas. Não há tanta novidade sobre como trabalhar o livro físico e isto se repete em qualquer lugar do mundo. Apenas isso, mas nenhuma alteração sobre uma extinção ou redirecionamento forte para um caminho no mercado.

5) Ser editor tornou-se uma profissão de investigação. Como são feitas as seleções e as apostas da editora? 
Almeida: É sempre uma investigação sobre o que as pessoas estarão interessadas no futuro. É um tanto de aposta, sim, porque não se pode prever tanta coisa com 12, 18 meses de antecedência. Nossas apostas são feitas pensando em tendências tanto de mercado geral quanto de nossos próprios leitores. E claro, trabalho com o acervo que tenho comigo. Só de experiência como editor, já são 24 anos.

6) A Bienal de São Paulo mal acabou e já estamos esperando mais. O que podemos prever da Faro Editorial na Bienal do Livro de 2017? Em 2015, houve o surgimento do escritor Vinícius Grossos, hoje um sucesso de vendas. Escritores novos podem ser apresentados ao público?  
Almeida: No ano de 2017 vamos ter muitas novidades. Faro vai lançar algumas coisas muito diferentes, embora estivessem sendo planejadas desde o seu início. Algo em Literatura Brasileira e também em Literatura Portuguesa, ambas clássicas. Temos a biografia do líder do A-ha. Temos um livro novo do Vinicius Grossos com duas novas autoras que estamos lançando, Gabriela Freitas e Thais Wandrovsky, e mais outros ainda não anunciados. A casa está aberta e sempre estamos interessados em conhecer novos autores, além de olharmos para os que já são consagrados. O único critério é estar dentro de nosso projeto editorial.

A Faro Editorial na Bienal do Livro de São Paulo, em 2016.

7) Além de Vinicius Grossos, Augusto Alvarenga é um grande nome da casa editorial no momento. Sendo um sucesso de vendas, os dois escreveram, juntos, um livro sobre representatividade. Você acredita que esse é um tema que veio para ficar entre os jovens, assim como a literatura fantástica e a literatura erótica fizeram anteriormente?
Almeida: Eu penso que sim.  Gosto muito da forma como eles abordaram e o livro teve enorme aceitação entre os público jovem. Vejo outros livros de outras editoras percorrendo o mesmo caminho.

8) Há uma atenção das casas editoriais voltada a esse sentido: reconhecer gêneros literários em alta e até mesmo reciclá-los. Isso vem atingindo outro tipo de autor: o youtuber, tão polêmico entre os leitores convencionais. Qual é sua opinião a respeito? E sobre o booktube?  
Almeida: Eu penso que qualquer esforço para fazer um não leitor pegar num livro é ótimo. Há livros de booktuber que são uma réplica preguiçosa do próprio texto falado nos blogs/vlogs e outros que são obras de ficção, de não ficção, independentes do conteúdo digital e de grande qualidade. Penso que o que tiver qualidade fica, o que se comunica com os leitores também. Além disso, boa parte desses não leitores podem travar um contato pessoal com o livro a partir de um autor de quem é fã no vídeo. E esse contato pode levá-lo a se interessar por algo além. Não é um processo que alguém controla e acho que ninguém precisa se preocupar com isso: se o leitor de booktuber vai passar a ler outros livros e autores. O mais importante é que todos os que consideram a leitura algo positivo se unam e não o contrário, discutindo se uma coisa é literatura e a outra não é.

9) O autor agora é um artista, arrastando centenas para as tardes de autógrafos e realizando turnês em livrarias pelo país. Da mesma forma, o leitor também se tornou um criador de conteúdo, promovendo eventos e encontros literários em torno de livros e assuntos variados. É correto dizer que as figuras convencionais do leitor, do escritor - e até mesmo do editor - estejam se confundindo (ou se fundindo)?  
Almeida: O autor sempre teve uma aura de grande artista. Era o intelectual admirado  do passado, quase inatingível, que escrevia uma coluna mensal em um grande jornal do país. Hoje muitos parecem um popstar, mas é menos pela diferença de tempo e mais pelo público que atingem. Na década de 80 uma banda de garotos arrastava uma multidão e uma banda famosa de MPB poderia almoçar na praça de alimentação de um shopping sem ser importunada. Você não vai ver esse mesmo frenesi hoje, por exemplo, com autores que, apesar de famosos, tenham um público mais maduro. O leitor hoje tem seguramente uma importância maior do que no passado, hoje ele está mais visível. Décadas atrás o escritor não sabia muito bem para quem escrevia e hoje isso mudou, o que certamente mexeu com o trabalho. Todo leitor, ao dar feedbacks mais imediatos, torna-se um ponto de consideração. É como se fossem pequenos sinais que mostram onde os escritores e editores têm de apostar para emocionar, mudar o caminho e investir em segmentos.


Para terminar, deixo aqui um link curioso de outra entrevista de Almeida, essa fornecida ao Publishnews, onde ele fala rapidamente sobre sua trajetória profissional e sobre como foi parar no meio de tantos livros. Vale a pena dar uma conferida

Agradeço imensamente ao Pedro e à Faro por ter se aberto a esse tipo de contato. Para mais informações sobre a editora, corre aqui