Sobre nossa lacuna emocional

22:16 Igraínne 2 Comments


Eu estive durante bastante tempo procurando, embora sem sucesso, o motivo pelo qual havia parado de escrever. Fossem eles fonte de estupidez ou baixa autoestima, fossem sonhos sufocados por editoras que tendiam, sempre e irrevogavelmente, a me jogar para baixo. Eu focava nessas teorias numa tentativa louca e insana de me convencer de que não era eu - eu achava que a culpa não era minha. Mas era.

Não li durante dois anos. A fileira de livros sobre meus móveis juntavam pó, uma calamidade que me afligia. Diversas vezes eu me sentei, começando. Jamais terminava. Eu tentava, mais uma vez, enganar-me. Eu sabia que eu não seria capaz de lutar contra aquilo vestindo casacos floridos e sufocando meus instintos com doces de padaria. Sabia que não dava para para tapar a ausência da palavra com decepções humanas. Eu era (sou), afinal, humana, não sou? 

Tive relacionamentos catastróficos. Usava-os para impulsionar retratos falados em formato de poemas, dizia a mim mesma que eles (Eles!) eram fonte de inspiração inesgotável. E eram, é verdade. Mas eu acreditava que, para escrever, precisava de impulsos emocionais desse tamanho. Precisava de dores desse tamanho. Precisava de impactos fortes o bastante para me fazerem cuspir nas páginas em branco dos meus cadernos, todos hoje já imundos.

Mas eu não precisava de nada disso. E sabia (sei) que eu jamais precisaria. Era suficiente que eu me atentasse a uma foto borrada do celular barato, que prestasse atenção aos tropeços que eu teimava em dar, que juntasse duas questões de uma prova.

Às vezes a gente dá ao outro uma função que nunca foi dele.

A função daqueles homens jamais havia sido me inspirar, embora era isso que me unisse, em essência, a eles (novamente, Eles!). Talvez eles só tivessem existido para provar que, apesar do mundo torto, ainda era possível tirar arte de qualquer coisa, por mais horrível e insalubre que fosse. 

E então me sentei, enfim, na frente do computador. E não busquei inspirações corriqueiras em alturas, em vozes pacatas, em homens sem nome. Procurei, pela primeira vez em muitos anos, inspiração em mim. 

E isso foi muito, muito mais fácil. 

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